quinta-feira, 3 de março de 2011

ANO 2002

 
     
      100 Conquistas, Sem Vitórias para a Arte Conquistense!
                                 CLAP! CLAP! CLAP!


Mais uma flor colhida no jardim da cidade das rosas. Jardim este que acaba perdendo sua fertilidade com tantas flores colhidas ao longo de 162 anos de existência. Aliás, as últimas flores são de plástico, colhidas por mera formalidade sagaz dos seus filhos mais ilustres, conhecidos ou desconhecidos.
Gostaria de ter muitos motivos para aplaudir de viva voz, a nossa cidade catingueira, mas existem tantos tropeços nesse percurso que não valem exaltações de contentamento.
Analisemos, pois, a arte conquistense nos últimos anos. O que ocorreu de marcante? Que grupos ou artistas têm resistido com dignidade, sem a devida atenção e apoio do poder público ou empresariado local?
De certa maneira a cidade mudou, conseguiu algumas conquistas noutros setores que nem precisamos mencionar, pois os outdoors já o fizeram. E nem adianta “tapar o sol com a peneira” ou tentar fingir que não se tem “culpa no cartório”, no cenário artístico cultural da cidade. Seria mais digno e verdadeiro colocar a “carapuça” e assumir a culpa de não ter feito nada para difundir e desmistificar a arte para a população, que tão carente de arte verdadeira, freqüenta e lota shows de pagode ou similares como única opção de lazer na cidade.
Onde estão os artistas da cidade? Observe se algum consegue projetar seu trabalho estendendo à comunidade, fazendo-a ver que arte não é mera catarse e sim a possibilidade de reflexão e mudança? Quem realmente faz um trabalho sério ou comprometido com a verdade? E quem consegue sobreviver sem apoio algum?
Parabéns para os políticos que continuam com a demagogia costumeira e com o sorriso mais amarelo possível. E quando o artista se mostra, dizendo ou questionando a realidade é vetado nos projetos que ainda são promovidos na cidade. È a velha retaliação política tão suja e tão antiga para um governo tão decente. Fiquem sabendo que a opinião pública é livre e ninguém vai calar minha voz. O que falta nesta cidade? (...)
Dou até meus punhos para colocarem as algemas da hipocrisia e desrespeito com que tratam os artistas na cidade das rosas.
Aliás, o artista é mero objeto de decoração de festas, não faz nada da vida, a não ser remexer a bunda freneticamente, cantar umas musiquinhas populares ou declamar uns textinhos para alegrar a corte e o povo que anseia por PÃO E CIRCO como na Roma Imperial. Que progresso, hein?!
E o bolo com quem fica? Com quem tem o poder de fazer algo e não faz. Com o empresariado que pouco aparece ou incentiva atitudes artísticas locais. Com os políticos que juram ser os representantes do povo e continuam não fazendo nada pela arte conquistense. E fica também com a população que, apática, não critica e nem busca seus direitos, acostumando-se com esta lavagem cerebral de possibilidades e mudanças que nunca chegam, onde para a arte pouco se fez ou nada se faz.
Enquanto isso, aqueles que não vendem a sua conduta estão batalhando, estudando para levar uma arte transformadora a quem precisa, mesmo sem apoio de outrem.
Um exemplo disso é o projeto ASSIM SE IMPROVISA promovido por artistas sérios que trabalham em prol de uma arte que não é comercial, mercenária ou panfletária. Esse projeto
(feito sem apoio algum!) acontece todos os sábados no ANEXO II, uma salinha “apertada” do Centro de Cultura, na qual neste último dia 09 (em pleno feriado de aniversário) teve um público de oitenta pessoas.

                 Parabéns, Conquista!
                 Só me resta agora um brinde!
                 O bolo está partido. A quem for merecido, sirva-se!
                 Desse aniversário só quero uma coisa: RESPEITO.


                Marcelo Benigno é ator, diretor, graduando em Artes Cênicas pela UFBA e professor de teatro da Fundação Cidade Mãe, em Salvador.

Publicado no Jornal Diário do Sudoeste no dia 02 de novembro de 2002.





PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORES OU  A GENTE NÃO QUER SÓ COMIDA -  Parte I


Não sou nenhum filósofo tampouco um estudioso nas áreas filosóficas que estuda o comportamento do ser humano emaranhado de conflitos existenciais, sociais, pessoais, culturais e todos os “ais” possíveis, seguindo de formulação de teses, causa e efeito, indicações clínicas, análises patológicas... ou tudo isso  será objeto de estudo das áreas psicológicas, sociológicas ou emocionais?! A resposta correta agora não vem ao caso, porém, o que não me sai da cabeça é aquela frase, quase um bordão clássico, conhecido por aqueles, que assim como eu, dominam as ciências sociológicas e decoram premissas como essas que  dizem assim: “ O homem é fruto do meio.”
 Constantemente estou usando esse pensamento nas minhas vivencias de trabalho, embora reconheça que como artista deva modificar o meio e também as pessoas.
Recentemente pude colocar em prática a minha observação sobre o tal bordão filosófico, num evento que acontece no Restaurante Universitário da UFBA pertencente às residências estudantis. Este evento chamado  “QUARTAS CULTURAIS” acontece todas as quartas-feiras, no horário do almoço, neste mesmo restaurante. O projeto mostra apresentações  artísticas e culturais de estudantes de artes nas mais distintas áreas que apresentam seus trabalhos  para uma platéia “faminta” que entre uma grafada e outra de comida, (sem suco!) passam uma “rabeada de olho” na programação do dia.
Tive a oportunidade de apresentar nesse último dia 12  de fevereiro, uma performance chamada “Pessoas” baseada em textos de Fernando Pessoa e suas outras pessoas escondidas nos seus heterônimos. Em meio ao interminável barulho, começo a encenação, que lança, entre outros questionamentos, o poder de escolha pessoal expresso pelo  livre arbítrio de cada um frente as suas possibilidade na vida .
Alguns colegas de teatro observavam as reações dos comensais a respeito da cena ali exposta e puderam comprovar  algumas considerações que temos a respeito de uma divulgação maior da arte para  os universitários, que mais interessados em terminar seus respectivos cursos, anulam outras necessidades que supostamente possam ter ou precisar que valorizam aspectos  pessoais, sentimentais e culturais, dedicando-se exclusivamente  na reprodução  de massa que estamos cansados de ver e ouvir nesse mundo globalizado.
Entre os tantos comentários, o que mais me chamou atenção foi o de uma moça que muito agitada,  comentava com sua colega que não “era obrigada a assistir aquilo” que tudo aquilo era inútil e sem propósito, enquanto sua colega tentava explicar a importância do fazer artístico frente à mensagem e compromisso do artista em divulgar, desmistificar, tornar acessível a  arte e cultura para todas as pessoas, pelo menos para as que queiram, provocando as que não queiram.
Tudo isso me levou a uma análise sobre o sacerdócio do artista e como as instituições educacionais podem contribuir para a formação cultural das pessoas,  seja através de uma arte acessível a todos, não somente para uma elite que domina o poder cultural dos grandes centros e monopoliza uma arte para poucos, seja através de projetos de extensão comunitária  que leva a arte  para muitos, seja através de uma política cultural voltada para o esclarecimento e divulgação artística, onde a discussão e o estudo da arte são destinados a qualquer um.Todavia, querer  que as pessoas tenham acesso a uma arte quase libertadora, que não seja meramente catártica , mas transformadora, pode incomodar muita gente.
Para se ter uma idéia, durante 10 anos a UESB - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, sediada em Vitória da Conquista, tinha um projeto chamado Grupos de Arte , onde permitia a classe universitária e à comunidade local o acesso a grupos de arte que  questionavam o universo  pessoal e social da cidade, através de uma linguagem artística. Nesse ano, entretanto, a nova reitoria decidiu vetar o projeto, sem maiores explicações, deixando as cidades de Itapetinga, Jequié e também Conquista sem seus 10 grupos artísticos e o pior, sem a possibilidade de reflexão que tanto afirmam fornecer as universidades  modernas quando querem aumentar sua proposta pedagógica- pseudo- artística -cultural e social, para talvez aumentar suas verbas, os números de especializações em qualidade total, incentivos financeiros para as carreiras comprometidas com o ideal vigente, etc e tal, patati e patatá.
Mas a UESB é do interior do estado, podem alegar.Mas a UFBA, o que tem feito de extraordinário nessa área?!(...)
Até o ano passado, aconteciam, neste mesmo restaurante da UFBA, oficinas  culturais para os residentes universitários, das três casas, onde participando de música, capoeira, dança, coral, artes plásticas, teatro e educação física, tinham acesso a uma linguagem artística e cultural. As oficinas aconteciam no restaurante mesmo.Puxavam-se as cadeiras e mãos a obra! Só que como tudo nesse país, ou nessa terra da alegria tem se um tempo, a verba para os cursos acabou e os universitários,  cada vez mais aculturados, ficaram chupando o dedo, e muitos como a nossa colega, aquela do restaurante, continuarão a reproduzir o que a tv mostra, o que o preconceito alimenta e o que suas limitações não tiveram como escolher ou optar. Mas ela não tem culpa, o que importa hoje são os ganhos e resultados da nossa sociedade eletrônica. Afinal, o Carnaval está aí mesmo e  Salvador, meu Rei, é campeã... campeã em violência, desemprego e tem o custo de vida mais caro do país.
O filósofo tinha razão quando dizia seu provérbio...
Nesse ínterim, depois dessa digressão toda que me passou na cabeça durante a performance, estouro o saco de água que faz parte da apresentação e tomo, assim como o personagem, um banho que lava a minha alma e parodiando Fernando Pessoa  no final do seu texto digo incessantemente: Dêem-me de beber, ainda tenho muita sede.


Marcelo Benigno é ator, arte educador,  diretor do Grupo Caçuá de Teatro (ex-grupo de Teatro da UESB), graduando em Artes Cênicas pela UFBA  e residente universitário daR1.

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