quinta-feira, 3 de março de 2011

ANO 2005



       Tanta Vitória Artística para uma Conquista Morta

                                                                                              Por Marcelo Benigno*


Prometi a mim mesmo que não voltaria a falar da decadência artística em que se encontra minha cidade, mas tem coisas que precisam ser ditas, principalmente para aqueles que insistem em se fazer de surdos, cegos e mudos no cenário político e cultural na terra de Glauber Rocha.
Vivemos uma fase de efervescência cultural dos artistas conquistenses e da arte de Conquista fora de sua cidade.
A mais recente vitória foi a do dançarino e coreógrafo Chefinho Santos, que foi selecionado numa Audição super concorrida, que aconteceu neste mês de agosto, para o Ateliê de Coreógrafos Brasileiros - Ano V, evento que acontece anualmente, em Salvador, promovido pela EP Produções.
Chefinho concorreu com mais de 260 candidatos para ocupar umas das 35 vagas, para bailarino, em um dos quatro espetáculos que serão desenvolvidos durante o período de dois meses, na capital baiana. Ele participará do espetáculo concebido pelo coreógrafo soteropolitano, Jorge Alencar, e deverá estrear no mês de outubro, deste ano, no Teatro Castro Alves, com os demais espetáculos que fazem parte do mega evento da Dança Contemporânea, em Salvador.
Todos da equipe do Ateliê se sentiram orgulhosos com a presença do talentoso dançarino conquistense vindo do interior. Só que o mesmo não acontece na sua cidade...
Infelizmente em Conquista a arte tem tido um descaso fulminante. A maioria de seus artistas está saindo da cidade buscando reconhecimento e trabalho fora dela. E não é só na área da dança, não!
Recentemente estive participando do VI Festival de Cenas Curtas do Grupo Galpão, com o trabalho: Entre a Cruz, a Espada e a Estrada - Como nasce um artista Sertanejo que aconteceu em junho, deste ano, em Belo Horizonte. Não obstante, não recebi apoio algum de nenhum órgão, empresa, político ou agiota conquistense, apesar deste trabalho ter sido o único selecionado, de todo o Nordeste, para tal festival. Se não fosse pelo o apoio da Fundação Cultural do Estado da Bahia, em Salvador, e da sensibilidade do Professor Armindo Bião, tal oportunidade de mostrar um pouco da nossa cultura, em outra região do pais, não seria possível!
Neste ano cinco trabalhos conquistenses, entre teatro e música, estão participando do Projeto Circuladô Cultural, promovido pela Fundação Cultural do Estado da Bahia, que leva espetáculos de música, dança e teatro, além de oficinas culturais para o interior baiano.
Estamos tendo a oportunidade de mostrar o nosso trabalho fora da cidade, sendo Conquista, a única cidade do interior com tantos trabalhos selecionados neste projeto até agora.
Não obstante, fui selecionado para dar oficinas de teatro, nos Centros de Cultura do interior, neste mesmo Projeto, que custeia somente o cachê do ministrante, ficando as outras despesas por conta dos “parceiros culturais” nas cidades as quais atinge.
Vocês acreditam que mesmo tendo indicado Conquista para receber este Projeto não consegui apoio sequer para as passagens?! Mas quando “neguinho e branquinho” “quer por banca” em Salvador, sabe falar que me conhece e ainda me patrocina e ajuda sempre!
É mole ou quer mais?!
Completando mais vitórias, a Cia Finos Trapos com a direção de Roberto de Abreu e composta por alunos da Escola de Teatro da Ufba, na sua maioria, de artistas teatrais conquistenses, radicados em Salvador, ganhou o Prêmio Estímulo da Fundação Cultural para a Montagem de Espetáculo de Pequeno Porte e o grupo escolheu Conquista para ser o palco de sua apresentação. Pode uma mãe ser tão ingrata e cruel com os seus filhos?!
Mas em Conquista pode tudo, desde transformar a Sala Polivalente, (única sala maior para oficinas), do Centro de Cultura, em Escritório da Universidade, ao filho ou namorada do dono da loja fazer comercial na tv...
E AINDA DIZEM QUE TEMOS UMA SECRETARIA DE CULTURA NA CIDADE!!!
Verdadeiramente, a Secretaria de Cultura de Conquista, criada neste ano, só existe nos contra-cheques dos seus funcionários, pois nunca fez nada pelo artista da cidade e quando solicitamos alguma ajuda ou patrocínio para a efetivação de projetos culturais dizem que não se tem recursos, etc e tal, ou inventa-se uma nova burocracia. Se não tem recursos porquê existir tal Secretaria? Por que para a Micareta, Natal da Cidade e artistas de fora saem sempre verba e capital?! Ainda não esqueci dos cachês gigantescos das atrações de fora e dos contratos políticos feitos nesses anos todos.
Aliás, eu não tenho memória curta mesmo, e já são quase 10 anos desta mesma história! Será que vai ter que mudar de governo para alguma coisa acontecer?! (...)
Dizem os altos falantes que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva estará em Conquista, nesta a quarta feira, dia 17 de agosto de 2005, inaugurando mais um projeto de sucesso.
Se a credibilidade do Governo Federal está em baixa, Conquista não é bom exemplo de incentivo à cultura e arte locais e nem de credibilidade com sua população e artistas que esperam por cultura, lazer e arte. Afinal, será que “eles, os homens”, sabem mesmos distinguir e conceituar estas três coisas, ou só falar em números e mostrar as bolsas de auxilio aos pobres e miseráveis?
Ter boa índole e dignidade hoje em dia é sinônimo de burrice ou ignorância, num país onde a maioria dos poderosos tem cuecas gordas e pastas abarrotadas de dinheiro sujo ou vindo dos nossos impostos e votos de confianças nas urnas eleitorais. Aliás, onde estão os três deputados conquistenses que elegemos e mandamos à Brasília? E os vereadores locais, cada vez mais apáticos e sem propostas culturais para a cidade? E o empresariado local que acredita na sua cidade? Já viram como estão o desemprego e violência em Conquista?
Pois, é! Não adianta tanta vitória por parte dos artistas mongóios quando na prática, a roubalheira e ostracismos estão soltos, e político, como diz meu pai, é tudo igual.
Só o tempo dirá se esta situação continuará a mesma, em todos os aspectos, nesta nossa cidade e neste país das maravilhas que luta diariamente para se achar.
Levanta Brasil! Ressuscita Conquista!
Até lá, continuaremos trabalhando e exigindo RESPEITO E DIGNIDADE para os artistas do interior. “Nois é Jeca, seu dotor, mais nois não é besta, não!” Ano que vem se aproxima...
E quando me elogiarem num próximo festival ou trabalho, ressaltando o fato de ser um artista interiorano, catingueiro, batalhador e me perguntarem como é a política cultural na terra de Glauber Rocha, que hoje é comandada pelo partido do Governo Federal, direi em luto e sem ressentimentos:
A arte em Conquista, meu caro, está morta!

*Marcelo Benigno é ator, arte educador, diretor do Grupo Caçuá de Teatro em Conquista, graduando em Artes Cênicas - Licenciatura pela Ufba, membro do Conselho Fiscal do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos e Diversões do Estado da Bahia - SATED, idealizador e coordenador do MOVAI - Movimento de Valorização do Artista do Interior.




 Em casa de ferreiro o espeto, que não faz milagre, é de pau.
                       Projeto de Teatro da TV Sudoeste exclui artistas da terra


Sou um apaixonado pela cultura popular, principalmente no que se trata das crendices, ditados, parlendas e mitos, que fazem da nossa literatura, um acervo vivo de pesquisas cada vez mais regionais e autênticas ligadas à comunicação do nosso povo, que sempre inventa um “dizê” para explicar suas histórias, conselhos e situações.
Mas falando em tradição, valores e arte locais, os ditados mais conhecidos me vêm à tona para explicar o título deste texto e evocar a sabedoria nossa para tentar entender o objeto destas linhas, e as causas desta antiga e instigante questão.
Nesse ano, mais uma vez a TV Sudoeste, emissora sediada em Vitória da Conquista e filiada a Rede Bahia, que por sua vez é filiada a Rede Globo de Televisão abre as atividades do seu Projeto Verão, tendo como extensão o Projeto Janelas para a Cultura, que tem como objetivo, levar apresentações de teatro para a região sudoeste da Bahia.
Entretanto, nesse ano de 2005 os artistas conquistenses ficaram excluídos da programação, sendo toda ela destinada a grupos de fora, principalmente da capital baiana.
Estando em Salvador e sendo artista conquistense fiquei pensando qual seria o motivo de tal exclusão e porque sempre as atividades de fora têm privilégios sobre as atividades e artistas locais.
Procurei no histórico da TV Sudoeste, olhando o sol sem peneira, algo que explicasse tal atitude da emissora local, que sempre, diga-se de passagem, apoiou seus artistas locais ao longo de sua história.
Para ser ter uma idéia, em 1996 já participava como artista teatral, do Projeto Pôr do Sol, onde a TV levava, aos principais bairros da cidade, várias atividades culturais como a dança, atividades esportivas, artes marciais, manifestações populares e o teatro, que se apresentavam para milhares de pessoas, que atentamente apreciavam todas as apresentações que finalizavam com um grande show musical.
A estrutura do projeto era grande, com palcos imensos instalados nos bairros e praças da cidade semanalmente, assim como o esforço de toda a equipe que, literalmente, levava a arte onde o povo estava.
Em 1997, estava em turnê na cidade de São Paulo e mesmo assim, vim para apresentar-me nesse mesmo Projeto.
Anos depois, o projeto mudou seu formato inicial sendo apresentado num único local no centro da cidade, com palco fixo. Continuei participando com o meu grupo, porém após tantas adaptações e mudanças no projeto, as atividades artísticas foram suprimidas pelas necessidades esportivas do mesmo.
Hoje, o Projeto mudou de nome e restringe a shows musicais e a atividades esportivas, ora ligadas a aulas de academias de ginástica e musculação, ora a esportes radicais, ora a dança axé da moda repetida e imitada por jovens e crianças que passam pela praça. Como se vê, perdemos mais uma vez um espaço conquistado, justo agora num momento de revitalização do teatro conquistense.
No ano passado surge então o Projeto Janelas para a Cultura que ressuscitava o teatro como manifestação artística na cidade. Nesse mesmo ano, nós, artistas teatrais conquistenses, conseguimos participar porque a Prefeitura da Cidade era parceira do Projeto e exigiu a participação dos grupos locais.
Porém o tratamento com os artistas da terra foi bastante diferente e até engraçado.
Para se ter uma idéia, no cartaz de divulgação do Projeto a foto do espetáculo da terra era minúscula e mal dava para ler o que estava escrito, sem mencionar o desrespeito e diferenciação explícitos em outras coisas menores e sacanas.
Vocês acreditam que nem água tinha nos camarins dos artistas conquistenses?!
Não obstante, que num dia após a apresentação do meu Grupo estávamos todos ensaiando no Centro de Cultura e vimos o grande “bifê” (é assim que se escreve, é tão chique que nem sei escrever) de frutas, bebidas, (inclusive água!), doces e salgados destinados aos artistas convidados, com toda a pompa e circunstância que os conquistenses sabem fazer para quem é de fora. Disso ninguém lembra ou menciona, afinal, filho de peixe, peixinho é, e cada macaco no seu galho, pensei. (...)
Mas o mérito dessa discussão não são estes detalhes sórdidos de produção e nem a participação dos grupos de fora no projeto, ou a óbvia praticidade oportuna de espetáculos da capital, (somos de paz e respeitamos a todos), mas a ausência de representação local ou a distinção no tratamento aos artistas da casa, que há anos vem contribuindo para o crescimento artístico da cidade e, por conseguinte, da emissora, que está localizada e destina-se a população do Sudoeste da Bahia e que, por excelência, deve incentivar os artistas e cultura da sua região. Concordam comigo?
Não quero ficar como a água mole em pedra dura, tanto bate até que fura vendo que muitas vezes quem tem um olho só, em terra de cego, é rei, e que sempre o que vem de fora será mais valorizado e prestigiado que os “santos da casa” que para sobreviver de arte, no interior, fazem mil milagres por dia.
Se estamos questionando é justamente para estabelecer um diálogo e não ficar vendendo uma imagem irreal e maquiada (que ironia), da arte, teatro e da mídia na cidade das rosas. Afinal, em televisão tudo são flores, mas na realidade a corda só quebra do lado dos mais fracos, dos mais desinformados, nunca dos mais manipuláveis e interesseiros, pois quem tem unha maior sempre sobe nas paredes alheias passando por cima de tudo e olhando só para o seu umbigo “talentoso” e bem relacionado.
Por isso lançamos em Salvador, o MOVAI - Movimento de Valorização do Artista do Interior, que tem como objetivo questionar e criar um espaço de discussão para os artistas sertanejos e interioranos que sofrem por falta de políticas públicas destinadas a eles, incentivos e projetos artísticos em suas cidades, e atitudes de exclusão, como esta, vindo de um órgão de comunicação importante para a cidade e formação de opinião pública.
Como as pessoas vão gostar do seu teatro se ele não é divulgado?!
Por que só há projetos e incentivos a artistas de fora?!
Por que tanta distinção e preconceito, senhores?!
Estamos de olho para que não só as janelas, mas as Portas da Cultura sejam escancaradas para quem realmente trabalha diariamente na sua cidade, seja no interior, na capital ou em qualquer lugar em prol da verdade, ética e de uma arte destinada a todos, em todos os seus aspectos, facções e interesses.
Para nós, quem espera às vezes cansa,
Saco vazio não fica em pé.    
E adaptando a sabedoria popular, em prol da verdade e do silêncio acomodado de alguns, recrio o meu ditado arretado e rasteiro:
Uma andorinha só não faz? Verão!

Marcelo Benigno é ator, arte educador, graduando em Artes Cênicas pela Ufba, diretor teatral e idealizador do MOVAI - Movimento de Valorização do Artista do Interior.

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